A peça com maior pH não apresenta riscos ao consumidor, mas para evitá-la é necessário minimizar o estresse do gado antes do abate
Os consumidores costumam rejeitar mais as carnes escuras, ou carnes DFD (escura, firme e seca, em português). A principal causa, segundo pesquisadores, é o estresse do gado antes do abate.
Foi investigado por mais de um ano o motivo da carne com o pH mais elevado, que é o que escurece a peça. Após ouvir especialistas e cadeia produtiva, não há monitoramento no país sobre quantidade de carcaças mais escuras.
Isso tem muito a ver com a imagem da carne brasileira. Somos os maiores exportadores de carne. A cadeia produtiva entende que a divulgação de que há certo percentual de carne com o pH acima pode afetar as exportações do produto. Com isso, não se cria o debate necessário sobre o tema. O monitoramento é muito comum nos Estados Unidos e na Europa. Mas aqui no Brasil, não há dados, somente indicações e estimativas.
Embora o consumo dela não traga riscos à saúde, é uma carne que precisa ser preparada logo, já que o pH elevado ajuda a deteriorar o produto mais rápido e não permite muito tempo de armazenamento, como explica o docente da Unicamp Pedro Eduardo de Felício.
– A carne DFD é um alimento para consumo rápido. Ela resiste, no máximo, uma semana na geladeira. A carne mais clara você pode armazenar até dois meses. A peça escura não oferece nenhum risco à saúde, mas ela deteriora rapidamente. O mais indicado seria para os serviços de refeição, aqueles que servem muitas pessoas, consumo rápido. Ela tem uma deficiência de sabor em relação a uma carne mais clara, mas não é um sabor estranho – explica Felício.
Sobre as causas do gado apresentar carne mais escura, o professor explica que isso está relacionado com fatores sociais do animal. A tendência são os bois não castrados, conhecidos como bois inteiros, serem mais suscetíveis a apresentar a carcaça mais escurecida.
– Pode ser um fator social, quando você reúne animais estranhos uns aos outros. Uma suposição que eu tenho, é sobre a hierarquia dentro do rebanho. Tudo envolve: o estresse na hora do embarque e o estresse climático, por exemplo. São praticamente dois tipos de gado que apresentam esse problema: o macho não castrado e a fêmea no cio, principalmente pela a excitação que passam, acabam mais propensos a um pH mais alto – explica o professor da Unicamp.
O especialista comentou que há possibilidade de não castrar o animal e conseguir cortes mais claros. Entretanto, o animal precisa ser muito manso e o produtor tem que reduzir ao máximo as possibilidades de estresse do gado durante o período pré-abate. Ele sugere que os frigoríficos façam primeiro o abate de bois inteiros, para que eles não sintam tanto a mudança de local.
O diretor técnico da JBS Bassem Sami Akl explicou como essa questão afeta o mercado de carnes. Para ele, é um problema que envolve toda a cadeia produtiva, já que uma carne mais escura tem menor tempo de prateleira e rejeição do consumidor.
– A grande parte de carne escura está relacionada ao manejo do animal. Nós podemos afirmar que isso ocorre na fazenda e no transporte ao frigorifico. O que nos cabe, dentro da indústria, é fazer uma manipulação adequada. Mas é necessário que toda a cadeia produtiva trabalhe para diminuir o estresse do animal. Precisamos reduzir e achar uma destinação melhor para essa carne escura – ressalta Akl.
O representante da JBS também afirma que muitos produtores optam por não castrar o animal por causa do ganho de peso mais fácil que esse tipo de gado tem. Mas, na visão de Bassem Sami Akl, essa questão não pode ser a principal para o produtor não castrar seu rebanho.
– O boi inteiro engorda mais fácil e o produtor prefere isso. Mas o boi castrado é o caminho, precisamos trabalhar na qualidade do nosso produto. Órgãos de pesquisa comprovam que animais inteiros apresentam carne mais escura. O produtor não pode pensar só no ganho de peso – lembra o diretor técnico da JBS.
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